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Série Cowboys do Vale 2 - À sombra da maldade

Chris Evans,
Resumo: Ele se apaixonara por uma garota meiga e gentil, porém, mal se casara e ela se
revelara uma mulher injusta e briguenta, exatamente como a mãe. Pior fora saber que ela lhe
dera o golpe do baú. Ou teria sido quando ela o acusou de ter tramado e executado o
assassinato de seu pai? Ele fora jogado numa cela por causa dela? De qualquer forma,
não mais importava. Nunca mais poria seus olhos naquela mulher insensata que devastara seu
coração e sua vida. A única coisa ruim era ter que ficar longe de sua filhinha, que
sofreria muito sem ele! Mas tinha que ter um pouco de dignidade na vida! Afinal, fora
acusado injustamente de um crime terrível!

                                            
capitulo 1
 - Oi...
Raphael virou-se ao ouvir aquela suave voz. Algo em sua mente o fez lembrar-se no mesmo intante
do passado. Fitou os olhos azuis esverdeados num rosto emoldurados pelos cachos louros da menina de dez anos que lhe dirigira a
palavra. E soubera, instantaneamente, que a cor desaparecera de seu rosto.
Como não sentiria tais sensações? O arrepio de pavor passeava por todo seu corpo.
Teria que ser muito mais insensível do que era para fingir que não sabia de quem era
aquela vozinha.
Era certo que não via e nem ouvia aquela menininha há alguns anos. Mas fora ele mesmo
quem fizera tal escolha. Vê-la uma vez por semana ou a cada quinze dias seria uma tortura
terrível! Para ele, era tudo ou nada. E, se não pudesse tê-la para sempre consigo, era
melhor não ter nada! Odiava qualquer coisa que lhe fosse concedida pela metade! Entretanto, naquele momento, percebia, com uma dor que lhe afogava os sentidos,
o quanto fora egoísta, duro e cruel.
Que culpa tinha a sua filhinha de que sua mãe se transformara numa mulher tão amarga e
cruel a ponto de acusá-lo de assassinato a sangue frio? A menina não tinha culpa de nada!
Era tão vítima quanto ele! E ele, seu pai, o ser que morreria por ela, que a adorava,
que chorara de tanta felicidade no dia em que sua filhinha nascera, que vibrara com seus
primeiros passos, que jurara a si mesmo jamais a abandonar, lhe virara as costas! À
própria filha! Como fora desumano! Como tivera coragem para ser tão cruel? Amava sua
princesinha! E lhe virara as costas, há seis anos, e se fora! Nunca mais a vira, desde
então! Nem mesmo quisera ouvir falar dela!
"Deus!" Como amava sua filha! Como tivera coragem de deixá-la crescer longe de seus
olhos, de sua presença, de seu amor. E nem mesmo estavam tão longe um do outro. Moravam na
mesma cidade. Na verdade, suas fazendas ficavam no mesmo caminho, na mesma estrada.
Não merecia um castigo divino por ter sido tão cruel e malvado contra o ser a quem
amava mais que a si mesmo?
Quantas saudades sentira daquela garotinha! Quantas vezes pensara em abandonar seu
orgulho de macho ferido e ir visitar sua filha, ouvir aquela risada que ele tanto amava e
que o acompanhara por todos aqueles anos! Será que ela ainda tinha aquela gargalhada
gostosa que tanto o deliciara? Será que ainda se lembrava de como caminhava para ele pedindo seu colo, seu
carinho? Será que ainda chamava por ele quando tinha medo?
Deus! O que fizera em sua vida por causa de sua teimosia, de seu orgulho, de sua
pirraça?
Reparou que ao lado da menina de olhos verdes e cachos louros havia uma outra
menininha mais ou menos da mesma idade que sua filha. Limpou a garganta.
- Oi... - Respondeu depois de um tempo em que tentara encontrar qualquer coisa para
dizer. Mas não encontrava nada dentro de si além daquela culpa sem tamanho e da escuridão
que ameaçava nublar sua mente.
Seu coração batia tão forte que ele ouvia cada batimento. O medo fazia suas pernas
amolecerem. Medo? Era um homem feito, de trinta e dois anos! Forte, rico e poderoso! De
que tinha tanto medo?
- Sabe quem eu sou? - A menina perguntou depois de olhá-lo por algum tempo, certamente
esperando que ele dissesse mais do que dissera.
O que responderia? Que sabia quem ela era? Se dissesse que sabia, ela perguntaria por
que jamais a procurara naqueles seis anos. Teria coragem para assumir o quanto fora
desumano com ela?
- Eu... - Calou-se. Não podia dizer nada. 
- Eu sei que você é Raphael Sivelie, meu pai. - A menina dizia entre triste e
decepcionada. - Ainda me lembro de você...
Rapha engoliu em seco. Podia perceber a tristeza daqueles olhos que mudavam de cor a
cada instante. Podia ver também a decepção, a mágoa, a dor. Coisa ruins que ele causara a
ela. Procurava em seu interior alguma coisa boa para dizer, alguma coisa que pudesse
tirar aquela expressão de angústia nos olhos de sua filha, ou, ao menos, alguma coisa que
não o fizesse parecer tão desumano como pai, mas não encontrava nada. Não tinha palavras em sua boca. Estava mudo de pavor e vergonha.  
- Eu sempre vejo você... Queria chegar perto, mas tinha medo. Achei que você não
queria falar comigo, que não gostava mais de mim... Um dia, você foi embora e nunca mais
voltou. Eu sempre perguntava para a mamãe quando você ia voltar para casa, mas ela dizia
que você tinha ido embora, que não voltaria mais. Então eu me perguntava se você não
gostava mais de mim, se não queria mais me ver. Achei que eu tinha feito alguma coisa
errada demais!
"Deus!" Sua filha se culpava? Sua filha achava que ele deixara de amá-la? Como podia
ela pensar assim se o que mais desejava era tê-la com ele, morando em sua fazenda,
aprendendo a ser uma Sivelie como ele? Mesmo assim, mesmo querendo dizer que não era o ser ruim
que provavelmente toda a Vila Rica deveria ter dito a menina que ele era, não conseguia
encontrar as palavras para dizer qualquer coisa. Estava tomado pelo pânico! Queria
abaixar-se no chão a fim de fitá-la nos olhos, queria envolvê-la num abraço tão forte que
pudesse apagar todos aqueles anos em que apenas sonhava com ela. queria poder dizer a sua
filha que a amava e que ninguém mais se interporia entre eles.
- Sempre achei que as pessoas podiam estar erradas. Aliás, eu sonhava com isso. Pedia
a Deus para que todo mundo estivesse enganado... Lembrava-me de você, de quando você me
pegava no colo e me abraçava... Dizia que me amava, que nunca me deixaria...
Raphael estava petrificado. Era como uma estátua de mármore que não conseguia se mexer,
falar, pensar. Apenas ouvia o que a menina dizia. Mas não conseguia expressar qualquer
reação. Fora pego de surpresa. Não imaginara que encontraria sua filha em meio a multidão
que se acotovelava por todos os lados. Já estava bastante tarde e ele resolvera ir ao rodeio naquele
momento pois achava que não encontraria sua garotinha por ali. Errara. Errara feio! 
Olhou a sua volta espantado. Há uma semana que a festa da cidade acontecia. Era uma
exposição agropecuária, que contava com barraquinhas pra todos os lados. Havia o rodeio,
o concurso de bandas e fanfarras, concurso da vaca leiteira, desfile da rainha da festa,
cantores sertanejos, desfile de escolas, concurso da melhor torta e, todas as noites daquela
semana festiva, tinha um baile onde o forró tocava até o dia clarear.
A cidade parava para aquela semana de festa. Os vaqueiros ficavam ansiosos, as mocinhas
enlouqueciam. Era a melhor oportunidade de se encontrar o que que se desejava. Enquanto as
mais ingênuas sonhavam com o amor de suas vidas, em conseguir levar um daqueles vaqueiros
ao altar, eles, por sua vez, ansiavam em levar uma daquelas garotas para sua cama. Mas sem
nenhum outro compromisso envolvido.
Era complicado! Elas sonhando em se casar e ter filhos. Eles, em permanecerem solteiros!
E assim, alguns acabavam embarcando numa relação sexual de uma noite com as mais
diferentes expectativas!
E, todos os anos, ao final da festa, tanto se ouvia falar de um ou outro noivado, como
de alguma garota que dera um mal passo, o que transtornava uma família inteira, quando a
moça tinha uma família que obrigava ao camarada a assumir pelas bobagens que fizera.
Entretanto, sempre havia aquelas que ficavam apenas com o filho sonhado, mas sem marido
algum. A aí, os fofoqueiros da cidade faziam da vida de tal garota, um inferno!
Não fora assim que acontecera com ele?    
Bem... Na verdade, não fora assim. Quase nenhuma família teria força suficiente para
obrigá-lo a casar, caso não quisesse. Afinal, ele pertencia a uma das famílias mais ricas
daquele lugar e duvidava que se tivesse deflorado essa ou aquela garota, um pai o forçaria
a casar-se contra sua vontade.
Mas tanto ele quanto seus irmãos, evitavam aquele tipo de armadilha. Nunca se
enrolavam com as meninas ingênuas e puras daquela localidade. E nem precisavam de tal
coisa. Havia muitas malvadas, naquele tempo, que morriam por deitar-se com um dos irmãos
Sivelie.
Disso, certamente, Rapha não podia reclamar. Mulher era o que jamais lhe faltara. Jamais
dormira duro de desejo, jamais dormira esfomeado. Sempre alguém aparecia e se oferecia de
coração ou de bandeja, a fim de aliviar a tensão que ele pudesse ter acumulado entre as
pernas.
A oferta era tanta e tão variada que, muito jovem ainda, já se sentia enfastiado.
Estava cansado daquela vida onde nem mesmo precisava estalar os dedos para ter os seus
desejos satisfeitos.
Tudo se tornava chato e monótono. Era certo que gostava de sexo. Gostava muito de se
afundar numa mulher, de passar suas mãos pelo corpo quente e macia de uma garota, de ver
seu membro duro ser engolido por uma fenda quente e úmida, de brincar de entrar e sair
daquela gruta molhada. Mas tudo o que era demais acabava enjoando. Ele, que adorava
sorvete de chocolate, ficava satisfeito quando se fartava com uma taça cheia. Todavia, eram
pouquíssimas vezes que repetira uma taça de sorvete. Acabava enjoando!
Mas quando conhecera Letícia, fora difícil enjoar-se dela. Naquela época, achou que a
desejava com tanto ardor por que ele era ainda muito jovem, que depois que tivesse
bastante dela, acabaria enjoando, como sempre lhe acontecera.
Mas o tempo passava e passava e ele a desejava cada vez mais.
Passado um certo tempo depois que retornara da universidade, ficara exausto de estar sempre rodeado
por uma quantidade excessiva de mulheres. Já na faculdade, era difícil manter a cabeça no
lugar certo com tantas garotas diferentes, dos mais diversos lugares a espreitar a ele e aos
amigos que formavam seu grupo de estudos e de amizades.
Naqueles quatro anos, nunca dormira sozinho. Sempre havia uma mulher em sua cama. E na
cama de seus amigos também. Tanto era assim que, volta e meia, revezavam-se, faziam um
rodízio de garotas para que as coisas mudassem um pouquinho.
Quando retornara a fazenda dos Sivelie, a bela e aprazível propriedade de sua família,
as coisas não mudaram muito. Fora quase um ano daquele vai e vem de mulheres
que sempre apareciam na fazenda, fosse a pé, de carro, de carroça, a cavalo. Sempre tinha
três ou mais mulheres revoando em volta dele e dos irmãos.
Até o maldito dia em que a filha dos Salviati retornara ao lar, depois de ter vivido
anos estudando fora.
Raphael nem se lembrava mais da menina. Quando ela estava na fazenda, quase nunca saía
de casa. Ouvia, naquela época, rumores de que Dorothea Salviati, sua mãe, era uma mulher muito agressiva e
descontrolada, que não conseguia se segurar quando contrariada.
Alguns até diziam que a pequena Letícia fora levada para um colégio interno por seu
pai a fim de livrar a menina dos maustratos de sua mãe.
Algumas pessoas ousavam dizer que a mulher fizera com que seu marido, terrivelmente
apaixonado, permitira que seus pais, os donos da fazenda, fossem embora de Vila Verde
levando o primeiro filho que ele e Dorothea haviam colocado no mundo. O homem, tão louco
pela mulher, nem se importara de ver seus pais o abandonarem, de levarem seu filho ainda
pequeno, com eles! As pessoas que conheciam essa história cometavam ainda que o velho
Salviati dissera que ele só veria o menino no dia em que se livrasse daquela bruxa cruel
com a qual o filho se casara. Todavia, o jovem Salviati jamais procurara os pais, jamais
se preocupara em saber qualquer notícia sobre o filho que lhe fora tirado!
Todos naquela cidade sabiam que a paixão doentia de Hamilton Salviati por Dorothea o
tornara um bobalhão, um ser sem vontade própria. Ao menos, até que a louca Dorothea
engravidasse outra vez e voltasse suas maléficas mãos para o mais novo integrante da
família! 
As fofoqueiras: Ieda, Josefa, Ivana e Natália, que faziam serão para poderem melhor
saber o que acontecia por trás das paredes de um lar, haviam criado um clube beneficente,
com a intenção de lutar pela moralidade das famílias daquela pequena cidade. E, para isso,
iam até as últimas consequências! Mas, sobre o menino que fora levado pelos após
paternos, mais de vinte anos antes, o tal filho de Dorothea e Hamilton Salviati, pais
de Letícia e avós de sua filha, as quatro mulheres não abriam suas bocas para dizer nada!
E assim, acreditavam que esta era a razão para que Letícia Salviati tivesse ido estudar
fora, sem que ninguém soubesse dizer se era no Brasil ou em outro país qualquer. Sabiam
apenas que, pela primeira vez na vida, Hamilton Salviati batera o pé ante a esposa e
afastara sua filha daquela mulher sádica, antes que algum mal acontecesse com a pequena
Letícia!
Diziam que durante os anos em que a garota estivera fora, apenas seu pai, Hamilton Salviati,
visitava a filha. Sua mãe, dona Dorothea, a ignorava completamente. Era comum que
Hamilton passasse todos os finais de semana com a menina em alguma
cidade qualquer da qual Raphael não tinha o menor interesse de saber onde ficava, embora,
sempre que ouvia falar da garota, sentia pena dela por ter uma mãe tão louca. Mesmo assim, se
perguntava se não era melhor ter uma mãe destrambelhada do que não ter nenhuma, como ele.
Naquela época, Raphael e possivelmente seus irmãos, não estavam nem um pouquinho
interessados em saber quem eram, como eram ou como viviam seus vizinhos.
A única coisa que o fizera inteirar-se daquela história era que, enquanto Hamilton Salviati
passava seus fins de semana com a filha, em algum lugar do país, ou, possivelmente no
exterior, sua mulher, Dorothea Salviati, divertia-se com o patriarca dos Sivelie.
Fora apenas esse detalhe que lançara, diante dos olhos dos irmãos Sivelie, uma atenção
maior ao que acontecia bem embaixo de seus narizes sem que eles se dessem conta. De um
momento para o outro, acabaram descobrindo que se interessavam e muito pelo que acontecia
na casa dos Salviati.
Contudo, descobrir que seu pai e a vizinha eram amantes havia chocado os três irmãos bem como os demais membros daquela
sociedade. Santhiago Sivelie era muito amigo de Hamilton Salviati. Não esperavam tal traição
de seu pai. Aquela história não combinava em nada com tudo aquilo que o velho pregava.
Mas nem mesmo houvera tempo suficiente para que os três irmão se inteirassem do romance entre seu
pai e a fogosa vizinha Dorothea Salviati. O velho Sivelie aparecera morto. Fora abatido com um
tiro de uma espingarda sem que se soubesse de onde viera a armadilha. Desde então, o
investigador de polícia Jorge del
Toro vivia xeretando aqui e ali, na pequena cidade de pouco mais de cinco mil habitantes,
quem teria atirado no chefe do clã Sivelie ou, como todos tinham álibis para aquele dia,
quem teria dado a ordem para que o velho fosse atingido mortalmente. 
De fato, Santhiago Sivelie, que montava garbosamente seu cavalo, morrera antes mesmo
de atingir o solo. Morrera imediatamente com uma bala que lhe atravessou o coração.
O veterinário doutor Rabelo, que chegara na fazenda mais ou menos três minutos após o tiro,
correra na direção do homem atingido. E constatara o fato. Santhiago Sivelie estava morto.
Abatido com um tiro certeiro que ninguém sabia dizer de qual direção viera, dada a
trajetória que o corpo do homem fizera ao cair.
E quem fizera tal coisa?
Todos pensaram em Hamilton Salviati. Afinal, era o melhor suspeito. Sua mulher dormia com
seu vizinho. Quem melhor para ver o velho Sivelie morto? Todavia, seu álibi era
incontestável. Estava há quilômetros dali com sua filha a caminho de Las Leñas, na
Argentina, uma das estações de esqui para onde sempre ia no inverno.
O que chamara a atenção do investigador Jorge del Toro fora o fato de que, naquele
ano, Hamilton Salviati havia deixado claro que não iria esquiar com a filha como sempre fazia,
indo com esta a quase todas as estações de esqui da América Latina. Já conheciam
quase todos os circuitos do Chile e da Argentina como Bariloche, Vale Nevado,
Termas de Chillan, Chapeuco, El Colorado, La Parva, Portillo, Pucún, E Cerro Castor.
Passava naqueles lugares muito tempo com Letícia, desde que ela completara cinco anos.
Agora, porém, sua garotinha pretendia voltar para casa, fazer parte de uma família. Já era
uma moça e não queria vier longe da mãe. Acreditava que agora, aos dexessete anos, saberia
lidar com aquela mulher que jamais a visitara dirante todos aqueles anos. Mas era sua mãe,
não era?                 
No entanto, al rever a mãe e toda a hostilidade que aquela mulher reservara para ela,,
duvidou de sua decisão e preferiu esquiar com o pai nas montanhas geladas dos Andes e
pensar no que faria depois.
Jorge del Toro estranhara aquela viagem quase que repentina, ainda mais que Santhiago
Sivelie havia sido alvejado pouco depois que Hamilton viajara.
No entanto, para a total frustração do assassino, que parecia deixar claro que queria
incriminar o vizinho traído, no exato momento em que Santhiago tombava morto pela bala que
lhe atingira certeiramente o coração, Hamilton Salviati entrava no avião, diante de uma porção
de testemunhas, rumo as Las Leñas, na Argentina, acompanhado por sua filha Letícia.
Mesmo assim, o investigador Jorge del Toro duvidara daquele álibi tão perfeito. E até perseguira Hamilton
Salviati por algum tempo, tentando fazê-lo cair em alguma contradição. Jorge del Toro não
afastava as suspeitas de que aquele fazendeiro fosse o mandante do crime. Mas fora inútil. O
homem nem soubera que Dorothea e Santhiago haviam tido um caso. E, de certa maneira, seria a
última pessoa a querer a morte de Santhiago Sivelie, já que sem o amigo e vizinho,
perderia tudo o que supostamente tinha.
O investigador da polícia sabia o quanto as cidades interioranas podiam ser quentes e
perigosas. Havia sempre muitos interesses em jogo e as pessoas traziam em sua história,
uma extensa trilha de assassinatos por terras, por gado, por todo o tipo de divergência,
desde que o Brasil era ainda uma simples colônia de Portugal. Não fazia muito tempo e
aquelas mesmas pessoas, agora tão distintas e com tanto poder, empregavam os mais temíveis
jagunços para resolver qualquer polêmica que as aborrecessem. Seria esse o caso naquele
vale tão abençoado com aquela natureza exuberante? Não saberia dizer. Suspeitos ele tinha
aos montes. Até mesmo alguns peões insatisfeitos por terem sido despedidos.
Então o investigador se virara para os três irmãos Sivelie. Um deles ou todos podiam
ser gananciosos o bastante para querer acabar com a vida do pai. Entretanto nada
encontrara contra os rapazes. Todo mundo naquela cidade de meia dúzia de fios desencapados
tinha um álibi!                             
Para complicar ainda mais a elucidação daquele crime com tantos suspeitos e ao mesmo
tempo, nenhum que se encaixasse, Jorge del Toro
acabara se deparando com outro assassinato sem suspeitos. Dessa vez fora o próprio Hamilton
Salviati que morria de uma forma muito trágica.
Era certo que entre uma morte e outra havia passado alguns anos. Na verdade, haviam se
passado seis anos. E Jorge del Toro, que não conseguira nenhuma pista sobre a
morte de Santhiago Sivelie até então, continuava num beco sem saída. Agora, além de ter que
procurar o assassino de Santhiago Sivelie, ainda tinha que descobrir como aquele incêndio que
levara Hamilton Salviati à morte tinha iniciado e por quem. Tudo apontava para um incêndio
criminoso. E ele desconfiava que quem matara Sivelie também assassinara Hamilton Salviati.
Logicamente, as suspeitas recaíram em cima da geniosa e sádica Dorothea Salviati Mas o
álibi da perversa e muito odiada mulher não deixavam a menor dúvida de que ela era
inocente, embora toda a cidade torcesse para que a bruxa má fosse encarcerada para sempre
de modo que nenhum habitante de Vila Verde voltasse a ouvir falar do nome daquela
impiedosa mulher!
Então, quem melhor se encaixava no perfil do assassino do que Raphael Sivelie? Era seu
melhor suspeito e tinha uma forte ligação com os dois assassinatos! Só precisava encontrar
seu cúmplice!
Raphael estremeceu ao se lembrar de todos aqueles fatos lastimáveis. Piscou os olhos esforçando-se para voltar ao presente e viu, consternado, que   
sua filhinha já não estava mais diante de si. Ficara tão ansioso em falar com ela, se
afundara nas divagações de sua mente atormentada e nem prestara atenção quando a menina se
fora. E ela deveria estar acreditando mesmo que ele não gostava mais dela, que não quisera
falar com ela. Sua filha viera até ele e ele a deixara partir sem dizer o quanto a amava,
o quanto sentia falta dela!
- Droga! - Exclamou irritado. - Que idiota que eu sou!
- Está zangado com o que agora? - Uma voz forte lhe tocou os ouvidos no exato momento
em que ele tinha se virado para o outro lado na esperança de ver sua filha e chamar por
ela.
Raphael virou-se e viu seu irmão, Ricardo Sivelie de pé ao seu lado. Para seu azar, seu
irmão exibia para ele justamente o lado de seu rosto que fora queimado. Aquilo trouxe na
mente a dor e a desgraça que o maldito incêndio causara a ele e aos seus irmãos. Um imenso
sentimento de culpa tentou fazer passagem até seu coração mas ele o expulsou com garra. De
nada adiantava a culpa, Não devolveria o perfeito rosto que seu irmão possuía antes
daquele maldito dia.
E relembrar aquilo, naquele momento, tornou-o mais forte diante da dor de ter estado
com sua filha, cara a cara e não ter tomado a menina em um abraço há muito ansiado.
Era bom lembrar-se do dia em que tudo ruíra. Não só sua casa tombara naquele incêndio,
mas toda a sua vida e a vida de seus dois irmãos.
- Minha filha veio falar comigo...
- É mesmo? - Interessou-se Ricardo demonstrando satisfação e curiosidade. - que notícia
maravilhosa! Como foi? O que disse a ela? Ela compreendeu por que afastou-se por tantos
anos? Vai conosco para nossa casa? E onde está ela agora?
- Calma... Calma... Não foi tão bom assim. Não consegui dizer nada mais que um apagado "oi". Deixei-a
falando sozinha, praticamente e, quando dei por mim, ela já havia partido. Deve ter
pensado que eu não queria conversar com ela e... - Calou-se de repente.
- O que sempre deixou claro nestes últimos anos, né? - Concluiu Ricardo um pouco
desanimado. - Cheguei a pensar que tinha abaixado um pouco esse seu orgulho idiota! Por
que a deixou falando sozinha?     
Raphael olhou o irmão por um longo tempo.
- Não consegui emitir nenhum som. Parecia que minha garganta estava cheia de areia.
- Foi isso mesmo ou foi a sua pirracinha, o seu desejo de não se rebaixar a ninguém?
Raphael ia contestar seu irmão mas achou melhor ficar quieto. Fora realmente o seu orgulho
que o forçara a afastar-se de sua filha.
- Vá procurá-la. Tente falar com a menina. Ela está tão magoada com o seu afastamento!
- Ricardo pediu. - E agora, isso! O que a menina não deve estar pensando agora, tadinha!
- Não! É melhor assim. Dessa forma ela sofre menos.
- Ela ou você? Não tem vergonha de causar tanto sofrimento a uma garotinha de dez anos
só por que teme que não possa ficar com ela definitivamente? Isso é absurdo! Prefere
desprezar sua própria filha só para não ter que dividir o amor da menina com a mãe!
- Isso é assunto meu e não seu. - Falou obrigando-se a olhar a enorme cicatriz  
que deformava o rosto do irmão. Era bom manter aquela dor latejando, viva. Não podia
fraquejar agora. Há seis anos não abraçava sua filha. Há seis anos seu irmão não sorria.
Há seis anos o investigador Jorge del Toro o algemara e o jogara numa cela da delegacia
acusando-o de ter matado Hamilton Salviati e talvez até mesmo seu próprio pai.    
Raphael pousou sua mão direita no chapéu e foi em direção à cerca onde as provas do
rodeio estavam acontecendo, dando as costas ao irmão Ricardo Sivelie que abanava
negativamente a cabeça enquanto via seu irmão afastar-se.
"Que camarada mais teimoso!" Pensou com desgosto. Sabia que nada demoveria Raphael
daquilo que colocava em sua cabeça.
- Que bicho mordeu ele? - Uma voz de trovão ressoou às costas de Ricardo que sem se
virar, reconheceu a voz do irmão mais velho, Zacharias que caminhava mancando apoiado numa bengala.
- Aquele teimoso... Melissa veio falar com ele e ele não lhe deu a menor confiança.
Zacharias olhou o irmão mais novo que se afastava a largos passos e suspirou.
- Ele sempre foi assim. Teimoso feito uma mula... Quando empaca é difícil movê-lo para
algum lugar.
- Bem... Ele é tão teimoso quanto você. - Ricardo observou. - Viu nossa sobrinha por aí?
Queria conversar com ela, desfazer um pouco a má impressão que Raphael deve ter deixado
na menina. Levá-la para uma volta na roda gigante... Ela ia gostar disso, não ia?
- Não vi, não. - Zacharias se fechara. Não gostava de ser considerado tão teimoso
quanto Raphael.
Raphael sentou em um lugar da arquibancada e tentou prestar atenção ao que ocorria na
arena. Mas não conseguia prestar atenção ao que acontecia lá embaixo. Pensava na filha.
Pensava também em Letícia, no quanto a amara e na dor que sentira quando a ouvira gritar
que ele matara seu pai. Não saberia dizer qual fora a pior dor de sua vida. Se fora no dia
em que recebera a notícia que seu pai morrera assassinado ou ouvir da boca da mulher a
quem tanto amava que ele era um assassino impiedoso! E depois de tudo, além de ser jogado
numa cela da delegacia, ao ser libertado, soubera que seu tempo com ela e com a filha
tinha acabado!
- Maldito incêndio!" - Bradou em meio aos gritos da multidão que vibrava com o
vaqueiro no meio da arena.


Série Cowboys do Vale 2 - À sombra da maldade






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